'Estupidez sem tamanho:' quem é o ex-Jovem Pan que falou com Cid sobre 8/1
Paulo Renato de Oliveira Figueiredo Filho, 42, classificou o 8 de Janeiro como "estupidez sem tamanho" em conversa com o ex-braço-direito do ex-presidente, Mauro Cid e cobrou que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) se manifestasse. O diálogo, obtido pelo UOL, sugere que o político se recusou a desmobilizar os atos golpistas.
Quem é ele?
Figueiredo Filho é neto de João Figueiredo, o último presidente da ditadura militar que governou o Brasil entre 1979 e 1985. O regime foi iniciado por um golpe militar em 1964 e durou 21 anos. Na gestão dele, que era general do Exército, foi extinto o bipartidarismo e promulgada a Lei da Anistia, que "perdoou" não só os opositores do regime, permitindo o retorno de exilados ao Brasil, mas também as autoridades acusadas de torturas.
Economista de formação, ele é filho de Paulo Figueiredo, primogênito do ex-presidente. Ele foi comentarista da Jovem Pan e é um influenciador digital bolsonarista. No Youtube, mantém um canal que leva seu nome com 455 mil inscritos.
Seus perfis em outras redes sociais foram tirados do ar por ordem do STF (Supremo Tribunal Federal) pela primeira vez em janeiro de 2023. Ele chegou a criar outras contas, também suspensas posteriormente, em que se apresentava como "jornalista brasileiro baseado nos EUA" e "censurado pela suprema corte brasileira".
Foi sócio de Trump na construção do Trump Hotel no Rio (que depois perdeu a marca e se tornou Hotel Ish). Figueiredo começou sua carreira no segmento de hotelaria de luxo no Rio de Janeiro, em que conheceu o presidente dos EUA. "Sou latino e Donald Trump me trata estupendamente. A quantidade de latinos que trabalham para ele é imensa, as babás dos netos dele são mexicanas... Essa imagem de racista que tentam construir não existe", disse ao jornal El País em 2015.
Em 2019, foi preso em Miami. Ele era suspeito de integrar um suposto esquema de pagamento de propinas a dirigentes do BRB, banco controlado pelo governo do Distrito Federal, em troca de recursos para a construção do então Trump Hotel, na capital fluminense. O empresário foi considerado foragido pela Interpol e terminou atrás das grades por alguns dias.
Virou comentarista da Jovem Pan em 2020. Em sua agem pelo canal, incitou extremistas bolsonaristas a deflagrarem uma guerra civil no Brasil, chamou de "estupidez" os atos de vandalismo praticados por apoiadores de Bolsonaro em 8 de janeiro de 2023, entre outros. Ele foi afastado em 2021 e depois demitido, quando já era alvo de investigação disseminar informações falsas.
Ele também atua como professor nos EUA. Parlamentares bolsonaristas participaram de um curso ministrado por Figueiredo em janeiro. As fotos foram compartilhadas pelo senador Jorge Seif (PL-SC). Também estavam no encontro os deputados Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Mario Frias (PL-SP), Marcel Van Hattem (Novo-RS), Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) e o senador Eduardo Girão (Novo-CE).
Segundo Seif, o curso tratou da história dos Estados Unidos. O senador afirmou que também foram discutidos outros assuntos frequentemente abordados pelos bolsonaristas, como aborto, liberação das drogas, redes sociais, a chamada "agenda woke" e ativismo judicial. "Paulo Figueiredo, em total doação, empenhou-se para ministrar esse curso intenso e transformador", escreveu.
Figueiredo foi denunciado por participação no golpe
O ex-comentarista foi denunciado pela PGR (Procuradoria-Geral da República) em 18 de fevereiro por tentativa de golpe. Segundo a PF, Figueiredo Filho atuou em suposta operação de "propagação de desinformação golpista e antidemocrática". Em suas transmissões ao vivo em seus perfis, Figueiredo também expôs militares que não se alinharam aos atos golpistas.
Influenciador era parte de grupo que tinha uma "missão" no golpe. Juntamente com o general quatro estrelas Braga Netto e os militares Ailton Gonçalves Moraes Barros, paraquedista do Exército, o coronel do Exército Bernardo Romão Correa Neto, e o ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, Mauro Cid, Figueiredo Filho integrava o núcleo responsável por incitar militares a aderir ao golpe de Estado, de acordo com relatório do STF (Supremo Tribunal Federal).
Figueiredo já havia afirmado que nunca houve tentativa de golpe e comparou a Polícia Federal à polícia secreta nazista. Para ele, as autoridades brasileiras buscam "silenciar tanto a mim quanto o trabalho que venho realizando para conscientizar a sociedade e as autoridades americanas sobre a escalada ditatorial em curso no Brasil, que segue cada vez mais alinhado com a China", escreveu em uma postagem no X (antigo Twitter).
Conversas com Mauro Cid publicadas pelo UOL mostram Figueiredo preocupado com o 8 de Janeiro. "Estupidez sem tamanho. O presidente Bolsonaro precisa se manifestar contra isso agora. Pelo amor de Deus. Eu estou no ar na Jovem Pan", disse à Cid. "Não vai... Acabei de falar com ele", responde o tenente-coronel.
A conversa revela, pela primeira vez, que Bolsonaro se recusou a fazer uma manifestação pública durante os atos. O ex-presidente só se manifestou às 21h17 daquela noite, depois que o governo federal já havia decretado intervenção na segurança pública do DF.
Figueiredo filho voltou a insistir que a denúncia seria perseguição política. Ele argumentou que teria expressado nas mensagens com Cid que "nada de bom" viria do 8 de janeiro.
O diálogo corrobora o meu posicionamento que é público: o 8 de janeiro foi uma armadilha na qual alguns caíram de forma estúpida. O presidente Bolsonaro, felizmente, ouviu o meu conselho e reviu sua posição, condenando os atos em seguida. O que é interessante e curioso para mim é: se a PF tinha o a estes diálogos e sabia da minha posição, por que aparentemente me indiciaram sem base alguma? E por que a PGR me denunciou? É claro que o motivo é político. Paulo Figueiredo Filho ao UOL.
O procurador-geral da República, Paulo Gonet destacou que o Figueiredo teria recebido, antecipadamente, uma carta que os golpistas fizeram para pressionar o comando do Exército a aderir ao golpe. O influenciador disseminou o conteúdo do documento enumerando quem seriam os militares contrários "a uma ação mais direta, contundente das Forças Armadas" para manter Bolsonaro no poder.
O influenciador buscou forjar um cenário de coesão dentro do Exército Brasileiro sobre a necessidade da intervenção armada, retratando os dissidentes como desertores, merecedores de repúdio pessoal e virtual. Aderiu, pois, ao projeto golpista da organização criminosa, do qual tinha ciência prévia, e instrumentalizou a sua condição de comunicador para provocar a cooptação do Alto Comando do Exército ao movimento golpista. Trecho da denúncia feita pela PGR
Diálogos também revelaram que o coronel Correa Neto sabia horas antes o nome dos comandantes militares que seriam expostos por Figueiredo Filho, então comentarista. O que demonstra, ainda segundo a PF, a existência de ação coordenada para expor e pressionar os militares que não aceitassem aderir aos planos golpistas.
*Com informações da Agência Brasil e de matéria publicada em 21/11/2024, 20/01/2025, 19/02/2025 e 15/05/2025.