'Alguém está pensando em você': chef Michelin faz comida em zona de guerra

Ganhador de duas estrelas Michelin, o chef espanhol José Andrés, 55, transita de cozinhas renomadas a áreas de conflito e desastres naturais para alimentar comunidades em situação de vulnerabilidade ao redor do mundo. Foi assim que ele fundou a organização World Central Kitchen, que já serviu mais de 450 milhões de refeições em 15 anos, do Haiti a Gaza.
O que faz a World Central Kitchen?
Projeto começou em 2010 após um terremoto devastador de magnitude 7 no Haiti. O chefe foi até o país para entender como poderia usar sua experiência culinária para ajudar pessoas em áreas de risco, e cozinhou em um acampamento ao lado de desabrigados.
''Daí nasceu a WCK. Quinze anos depois, cozinhamos e servimos ao lado de pessoas do mundo todo em seus momentos mais difíceis'', explicou o chef, em conteúdos publicados no site da organização.
Andrés ouviu a comunidade haitiana e organizou esforços para fornecer refeições nutritivas e culturalmente adequadas. À época, mais de 200 mil pessoas morreram no terremoto, que também deslocou milhões e deixou inúmeros haitianos em extrema necessidade de alimentos e ajuda.
Para o espanhol, a comida é ''mais do que sustento, é um prato de esperança em dias sombrios''. Mas, destaca, o trabalho só é possível devido à rede que construíram ao longo dos anos, que os permite responder imediatamente quando situações ocorrem.
Uma refeição bem pensada e preparada na hora não só é uma preocupação a menos para alguém após um desastre, como também um lembrete de que você não está sozinho, que alguém está pensando em você e que alguém se importa. A comida tem o poder de ser o alimento e a esperança de que precisamos para nos reerguermos nos momentos mais sombrios
WCK
Em 2017, quando o furacão Harvey atingiu Houston, nos EUA, o chefe agiu novamente. Um mês depois, o furacão María devastou Porto Rico e José voou para San Juan e preparou comida em um pequena cozinha. Em seguida, ele recrutou uma rede de chefes, food trucks e voluntários para ajudá-lo.
A WCK já atendeu a crises nos seis continentes, desde furacões, incêndios e tsunamis, a guerras e pandemias. Segundo o site da organização, o grupo atuou para alimentar desde funcionários de hospitais durante a Covid-19, até a famílias ucranianas afetadas pela guerra com a Rússia, palestinos deslocados na Faixa de Gaza e refugiados que chegaram à fronteira dos EUA.
Organização também capacita a comunidade local para liderar o processo a longo prazo. A Rede de Produtores de Alimentos da WCK funcionou por cinco anos apoiando pequenos produtores de alimentos em Porto Rico, Bahamas, Guatemala e Ilhas Virgens Americanas. Eles também arrecadam fundos para manter os trabalhos e oferecer refeições frescas a comunidades que precisam. Quem quiser, pode doar pelo site da organização. O chef José costuma dizer que "todos fazem parte da World Central Kitchen, talvez ainda não saibam!".
Em 2025, José entrou para a lista das 100 pessoas mais influentes na filantropia. ''Hoje em dia, é fácil sentirmo-nos sem esperança, porque não importa o progresso que alcançamos, sempre aparece que nunca é o suficiente, que há muito mais trabalho para fazer. Mas juntos, meus amigos, nossas ações individuais têm um impacto coletivo imparável'', escreveu em comemoração ao anúncio.
WCK teve trabalhadores mortos e foi forçada a interromper trabalho em Gaza
Ao menos sete trabalhadores da WCK foram mortos durante atividades em Gaza. Um ataque israelense a um comboio da World Central Kitchen deixou sete filantropos mortos em abril de 2024. Segundo a organização, outro membro foi morto em um ataque em novembro ado, mas Israel alegou que ele era um militante.
No início de maio, a ONG informou que precisou parar os trabalhos por falta de suprimentos. Após servir mais de 130 milhões de refeições e 26 milhões de pães desde o início do conflito na região, a WCK disse que não conseguiu repor os estoques de alimento porque Israel fechou as travessias de fronteira para bloquear totalmente o enclave.
''Chegamos ao limite do que é possível'', disseram. A organização contou que recorreram a combustíveis alternativos como paletes de madeira e abandonaram receitas com arroz, que exigem mais cozimento. Ainda assim, não conseguiram continuar o trabalho. Dias depois, Israel liberou a entrada de ajuda humanitária em Gaza, mas em 28 de maio a organização ainda tinha dificuldades para entrar na região, por falta de rotas seguras.
Nossas as podem estar vazias, nossos fogos de cozinha apagados, mas a World Central Kitchen continuará servindo. Nossos caminhões -- carregados de alimentos e suprimentos -- aguardam no Egito, na Jordânia e em Israel, prontos para entrar em Gaza. Mas não podem se mover sem permissão. A ajuda humanitária precisa ter permissão para fluir
José Andrés, nas redes sociais