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349 mortes na Índia: o erro que causou batida no ar mais mortal da história

Bombeiros limpam os destroços ainda fumegantes do Boeing 747 da Saudi Arabian Airlines, hoje Saudia - Robert Nickelsberg/Getty Images
Bombeiros limpam os destroços ainda fumegantes do Boeing 747 da Saudi Arabian Airlines, hoje Saudia Imagem: Robert Nickelsberg/Getty Images
do UOL

Colaboração para o UOL

05/06/2025 05h30

Em 12 de novembro de 1996, um simples erro de comunicação causou a colisão de dois aviões no ar sobre Charkhi Dadri, na Índia, que matou 349 pessoas, o acidente mais mortal deste tipo da história da aviação.

O que aconteceu

Acidente envolveu os voos 763 da Saudi Arabian Airlines (hoje Saudia) e o 1907 da Kazakhstan Airlines. Enquanto o voo da Saudia, um Boeing 747, deixava Déli, às 18h32 do horário local, o voo da Kazakhstan Airlines, um avião Ilyushin 76, estava fazendo sua descida na cidade indiana.

Os voos avam por um estreito corredor aéreo, o G-452, uma espécie de estrada nos céus com "mão dupla". Ambos eram monitorados pelo controlador V.K. Dutta.

Logo após a decolagem, o voo da Saudia recebeu o ok do operador para atingir a altitude inicial de 10 mil pés (3.050 m). Dois minutos depois, Dutta liberou o avião do Cazaquistão para descer à altitude de 15 mil pés (4.550 m). Em seguida, o controlador liberou que o Boeing da Saudia, na direção oposta do Ilyushin 76, chegasse a 14 mil pés (4.250 m). Em poucos minutos, a tripulação da Saudia pediu autorização para subir mais, mas Dutta ordenou que aguardassem. O piloto respondeu que manteria a altitude de 14 mil pés então.

Em seguida, o avião da Kazakhstan Airlines reportou à torre que tinha chegado a 15 mil pés, mas ainda estava a 16.348 pés (5.000 m) e continuava descendo. Dutta então respondeu que "havia identificado tráfego na direção oposta, recíproco, com o Saudia Boeing 747 a 10 milhas (de distância) e provável cruzamento nas próximas cinco milhas". Ele perguntou aos pilotos cazaques se conseguiam ver o avião.

Restos retorcidos de assentos em meio aos destroços um dia após o Boeing 747 da Saudi Arabian Airlines e o avião de carga KazAir Ilyushin-76 do Cazaquistão colidirem no ar em um acidente que matou todos a bordo - Robert Nickelsberg/Getty Images - Robert Nickelsberg/Getty Images
Restos retorcidos de assentos em meio aos destroços um dia após o Boeing 747 da Saudi Arabian Airlines e o avião de carga KazAir Ilyushin-76 do Cazaquistão colidirem no ar em um acidente que matou todos a bordo
Imagem: Robert Nickelsberg/Getty Images

O operador de rádio da aeronave cazaque, Egor Alekseevich Repp, pediu que ele esclarecesse o que disse. Dutta respondeu que havia tráfego em oito milhas, no nível 140 (14 mil pés), o que Repp sinalizou ter compreendido. Menos de um minuto depois, a tripulação de uma aeronave de carga da Força Aérea dos EUA contatou a torre pelo rádio relatando "uma grande explosão". Dutta tentou entrar em contato com os dois aviões, mas não houve resposta.

As duas aeronaves haviam colidido; a asa esquerda do voo cazaque "cortou" a asa esquerda do Boeing saudita, que perdeu o controle e ou a cair em espiral a uma velocidade quase supersônica: 1.135 km/h. O Ilyushin também caiu próximo ao Boeing; todos os 312 ageiros e tripulantes do voo saudita e 37 no avião cazaque morreram.

A investigação revelou na caixa-preta do avião saudita que os pilotos começaram a fazer a oração do perdão do Islã pouco antes do impacto, a 100 km de Déli. O Boeing caiu nas proximidades do vilarejo de Dhani, enquanto o Ilyushin foi achado no vilarejo de Birohar.

Um dos fatores que causaram a colisão foi o entendimento ruim do inglês dos membros do cockpit da aeronave cazaque, apontaram as autoridades indianas. Os pilotos entenderam que deveriam continuar sua descida, enquanto o controlador pedia que mantivessem a altitude e reportassem a visualização do avião saudita.

Peça com insígnia da companhia aérea retirada dos destroços do jato de ageiros Boeing 747 da Saudi Arabian Airlines - Robert Nickelsberg/Getty Images - Robert Nickelsberg/Getty Images
Peça com insígnia da companhia aérea retirada dos destroços do jato de ageiros Boeing 747 da Saudi Arabian Airlines
Imagem: Robert Nickelsberg/Getty Images

Autoridades cazaques refutaram a teoria de que a tripulação não compreendesse bem o inglês, já que seus registros mostravam que eles eram fluentes em inglês. Como teoria alternativa, foi apontada a possibilidade de que o avião tivesse enfrentado turbulência que dificultou a comunicação, mas a perícia apontou que, além de relatórios meteorológicos do dia, apontaram que a gravação ruim era resultado de problemas de equipamento da aeronave e não turbulência.

Minutos antes da colisão, o operador de rádio Repp percebeu o erro do piloto. Ele gritou para os colegas "segurarem a altitude", de acordo com a caixa-preta. As autoridades acreditam que ele acabou olhando o altímetro e percebeu que estavam no nível errado. Uma hipótese levantada por especialistas à época, reportou a CNN, é a de que o piloto tivesse errado no cálculo, já que os pilotos da antiga União Soviética ainda usavam o sistema métrico para altitudes (em metros), enquanto o restante do mundo utilizava o imperial (em pés).

O comandante questionou qual foi a altitude dada pelo controlador, enquanto o operador pediu desesperado que se mantivessem a 15 mil pés. Neste momento, o piloto tenta voltar a altitude em que deveria estar e se choca com o Boeing.

Apesar de o público ter responsabilizado, de maneira imediata, Dutta e outros controladores de voo, a investigação revelou que não havia uma única causa para a colisão. Além disso, ele não tinha como verificar de maneira independente se pilotos estavam seguindo suas ordens já que, naquela época, o aeroporto só contava com radares primários que apontavam a posição dos voos no céu, mas sem indicações de altitude e direção. Dutta anotava informações em papel, seguindo o que era reportado pelos pilotos.

O Sindicato de Controladores de Tráfego Aéreo da Índia ainda emitiu um comunicado à época questionando a responsabilização de Dutta. Segundo arquivos do jornal The New York Times, a organização afirmou que a colisão "poderia ter sido prevenida se houvesse rotas separadas de partida e chegada ao aeroporto de Déli", ao contrário da teoria das autoridades aéreas indianas, que defendiam que o protocolo de 1.000 pés de distância entre aeronaves, cumprido por Dutta, era o suficiente para prevenir choques.

Desde então, o Sistema Anticolisão de Tráfego (TCAS, na sigla em inglês) se tornou padrão no mundo todo e não apenas nos EUA, como era à época do acidente. Este sistema de alerta autônomo não depende das informações das torres e alerta as aeronaves em rota de colisão para que se movimentem dos arredores umas das outras.

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