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País convidado de honra, Brasil teve participação recorde no Mercado do Filme de Cannes

22/05/2025 11h53

O Marché du Film (Mercado do Filme) do Festival de Cannes, que este ano teve o Brasil como convidado de honra, terminou nessa quarta-feira (21). A participação brasileira no maior evento da indústria cinematográfica mundial foi recorde e positiva, segundo os organizadores. Mas a produtora e diretora-executiva da Ong Nicho 54, Fernanda Lombo, que não integrou a delegação oficial, criticou em Cannes a distribuição de verbas públicas para o setor. 

A delegação oficial do Brasil no Marché du Film de Cannes, liderada pela ministra da Cultura Margareth Menezes, era composta por 65 profissionais. Mas segundo dados do Mercado do Filme, mais de 400 brasileiros se cadastraram este ano, ampliando a visibilidade do cinema nacional no evento e a possibilidade de acordos. 

Além de uma vasta programação de encontros, palestras e debates, o Brasil estava presente com os estandes do Cinema do Brasil (programa de promoção comercial do cinema brasileiro no mercado internacional), Spcine (Empresa de cinema e audiovisual da cidade de São Paulo) e RioFilme (da cidade do Rio de Janeiro). 

Cinema do Brasil participa do Mercado do Filme de Cannes há 18 anos. Para André Sturm, presidente da entidade, tudo estava reunido para que este ano tivesse uma participação excepcional. 

"Delegação recorde de produtores, filmes na seleção oficial, filme na competição pela Palma de Ouro, filmes em outras seleções, uma presença marcante. Nós tivemos um prêmio importante no Festival de Berlim, o Oscar de melhor filme Internacional pela primeira vez, e agora o Brasil o país [convidado] de honra [em Cannes], uma conexão astral muito positiva", resume Sturm. 

Parceiras internacionais

A Spcine marca presença em Cannes há 4 anos com um estande e trouxe 10 empresas paulistanas nesta edição do Marché du Film. A participação foi superpositiva na opinião de Lyara Oliveira, presidente da Spcine, que anunciou duas novas importantes parcerias durante o evento. 

A primeira parceria é entre Spcine, RioFilme e Projeto Paradiso, com um importante fundo Internacional, o Hubert Bals, sediado em Amsterdã. Esse anúncio "repercutiu muito bem aqui, junto ao setor brasileiro, junto ao setor Internacional", indica Lyara Oliveira. "O Hubert Bals não é só um fundo que coloca recursos (em novas produções), mas é um fundo também que dá uma chancela para um projeto", explica.

O outro anúncio foi o lançamento de um edital inédito de coprodução internacional com África do Sul. Essa parceria "vai contemplar dois projetos brasileiros e dois 2 projetos da África do Sul que tenham conexões de coprodução entre os 2 países", detalha a presidente da Spcine. 

Brasil como set de filmagens 

A RioFilme festeja que dois dos filmes selecionados este ano, o curta "Samba Infinito" na Semana da Crítica, e o documentário "Para Vigo Me Voy", são produções cariocas. A agência e distribuidora de cinema do Rio de Janeiro trouxe para o Mercado cerca de 50 empresas que participaram de dezenas de reuniões.  

"O primeiro objetivo é criar essas conexões qualificadas entre as empresas cariocas, realizadores cariocas e o mundo. Cannes é superimportante porque todo mundo está aqui. São mais de 15.000 pessoas de 140 países", ressalta Leonardo Edde, presidente da RioFilme. 

Como também faz a Spcine, outro objetivo "é promover a cidade do Rio de Janeiro como destino cinematográfico, como destino para grandes eventos. Hoje, você consegue filmar praticamente em qualquer lugar da cidade, com total apoio da Film Commission, da prefeitura do Rio de Janeiro", garante Leonardo Edde. 

Apoio para o desenvolvimento de projetos 

O Mercado do Filme é o espaço onde produtores e cineastas confirmados ou independentes, veteranos ou novatos, buscam parcerias, financiamentos e coproduções para seus projetos. O brasileiro Rodrigo Ribeyro foi um dos jovens selecionados para a Residência Artística do Festival de Cannes e apresentou durante o evento o projeto de seu primeiro longa-metragem, tentando captar recursos e "conseguir coproduções para tirar o projeto do papel".  

O jovem cineasta pôde, durante os primeiros dois meses da Residência Artistica, desenvolver sua ideia de filme. "Foi um período de muito foco, muito trabalho. Eu chego no festival já muito tranquilo, com a versão mais madura para o momento atual". Ele espera poder começar a filmar seu primeiro longa, talvez, em 2027.  

"É um filme que de alguma forma dialoga com os (meus) curtas-metragens que são praticamente todos filmados na Serra da Cantareira e sempre tratando dessa dinâmica conflituosa e complexa entre a vida urbana e a vida que seria rural, por assim dizer, adicionando camadas de um realismo fantástico que eu sempre quis trabalhar", revela. 

Cinema fantástico 

O longa "Love Kills", de Luiza Shelling Tubaldini, mostrou em Cannes o gênero fantástico no cinema brasileiro. O filme foi o único do Brasil a participar do Fantastic Pavillon/Blood Window, programa voltado aos gêneros de horror, suspense e fantasia da América Latina e Espanha, no Marché du Fim. 

Ambientado no centro de São Paulo, o filme sobre a história de amor de uma jovem vampira preta e um humano, está em fase de finalização e estreará em breve nas telas. "A gente teve uma recepção absolutamente maravilhosa e estar aqui junto ao mercado de Cannes foi também um grande prazer", conta Luiza  Shelling Tubaldini. 

Críticas à distribuição de verbas do setor 

O Instituto Nicho 54, que marca presença em Cannes já há alguns anos, não integrou a delegação oficial do Brasil. A Ong foi convidada pelo Mercado do Filme e organizou o "As vozes da maioria no cinema, os 54% de negros do Brasil não podem esperar".  

Segundo Fernanda Lombo fundadora e diretora-executiva do Nicho, essa "foi uma experiência única e inédita, na verdade histórica, que uma organização preta trouxe para cá uma narrativa sobre a realidade do que nos acontece no Brasil e, a partir disso, atrair parceiros". 

Ela enumera as várias "necessidades" para apoiar os profissionais pretos e aumentar a participação deles no setor. "Maior investimento na formação de empresários e de profissionais; maior participação no o de investimento à produção e à distribuição; internacionalização." 

Fernanda Lombo critica a falta de transparência da atual distribuição de verbas públicas para o setor. De acordo com ela, os profissionais pretos estão sendo preteridos. 

"A gente está vivenciando um fenômeno de muito concentração de recursos, de uma desproporcionalidade em relação ao investimento, sobretudo público. Na medida em que a concentração de recursos vai para empresas hegemônicas, que a gente entende que são lideradas por profissionais brancos, não há um compromisso estabelecido pelo estado, pelo governo, para que essas empresas diversifiquem as suas contratações", denuncia. A diversidade no setor cinematográfico atualmente é "um retrato de retrocesso que lembra muito uma realidade do Brasil de 10 anos atrás", completa. 

O Mercado do Filme terminou, mas o Festival de Cannes continua até sábado, 24 de maio, com o anúncio dos vencedores desta 78ª edição. O Brasil está na disputa pela Palma de Ouro com "O Agente Secreto" de Kleber Mendonça Filho. 

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