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'EUA em primeiro lugar' nos oceanos, uma ameaça à governança do mar

28/05/2025 09h59

A porta que Donald Trump abriu para a mineração em águas profundas, criticada por ambientalistas, pode representar uma ameaça à governança dos oceanos, segundo especialistas que questionam o direito dos Estados Unidos de tomar essa medida sem supervisão internacional. 

Das normas de navegação à exploração de recursos, o direito marítimo é amplamente regido pela CNUDM, a convenção das Nações Unidas sobre o assunto, adotada em 1982 na tentativa de evitar "uma luta implacável" pelo controle do fundo do mar, nas palavras de seu pai espiritual, o diplomata maltês Arvid Pardo. 

Os Estados Unidos nunca a ratificaram, mas aplicam muitas de suas cláusulas. 

"São grandes beneficiários dessas normas, já que desfrutam de uma das maiores Zonas Econômicas Exclusivas (ZEE) e da liberdade de navegação para seus navios de guerra", disse à AFP Coalter Lathrop, advogado internacional do escritório americano Sovereign Geographic. 

Ao mesmo tempo, "o restante do contrato ? de que o leito marinho e seus minerais em águas internacionais são patrimônio comum da humanidade ? é ignorado e isso é desestabilizador (...) para a ordem jurídica dos oceanos".

"Uma autorização unilateral americana poderia levar à desintegração de um sistema cuidadosamente selecionado e projetado pelos Estados Unidos para seu próprio benefício", alertou.

Os Estados Unidos tiveram grande influência na CNUDM, que criou o conceito de ZEE, uma zona marítima sobre a qual um Estado exerce soberania exclusiva até 200 milhas náuticas (370 km) da costa, teoricamente impedindo que embarcações pesqueiras estrangeiras a explorem. 

No final de abril, Trump assinou um decreto que solicita aos membros de seu gabinete que agilizem a concessão de licenças para a exploração de minerais cobiçados, inclusive em águas internacionais, segundo uma lei americana de 1980.

- Ação "unilateral" -

Ao mesmo tempo, a empresa canadense The Metals Company apresentou o primeiro pedido de extração comercial em alto-mar nos Estados Unidos. Ao fazê-lo, contornou a Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (ISA), que a CNUDM incumbiu de istrar além das jurisdições nacionais. 

A decisão indignou os defensores dos oceanos e muitos Estados-membros da ISA, entre eles a China, que denunciam uma violação do direito internacional.

Essa ação "unilateral" estabelece "um precedente perigoso que pode desestabilizar todo o sistema de governança dos oceanos", lamentou a secretária-geral da ISA, Letícia Carvalho. 

Este decreto é "a coisa mais perigosa que Trump já fez", segundo Guy Standing, economista da Universidade de Londres, que teme que a CNUDM se "desfaça" e leve outros países a se sentirem livres para ignorar o direito marítimo. 

"Isso pode levar a uma divisão em diferentes partes do mundo", com, por exemplo, "Rússia, China e Estados Unidos dividindo o Ártico", disse Standing à AFP.

Esse argumento é rejeitado por James Kraska, professor de Direito Marítimo Internacional na US Naval War College, que considera "ingênuo pensar que os Estados Unidos tenham esse tipo de influência" em um mundo que não é mais "unipolar".

abd/cyb/atm/mr/mel/aa/fp

© Agence -Presse

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