'Roubaram minha vida': ex-jogador diz que teve nome usado por falso atleta

O ex-jogador de futebol Iranaldo do Nascimento Silva afirma que sua identidade foi usada por outro atleta para atuar profissionalmente em cinco clubes do país, sem que ele soubesse.
O que estou ando eu não desejo para ninguém. É uma coisa muito dolorosa.
Iranaldo do Nascimento Silva
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Iranaldo era jogador profissional de futebol e hoje é servidor público na Paraíba. Ele diz que só soube da agem do "farsante" pelos clubes em 2023 ao tentar sacar o abono do PIS/Pasep e ser impedido. Ao consultar o sistema do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), diz que encontrou vínculos empregatícios com clubes pelos quais jamais atuou.
Agora, ele acredita que sua identidade tenha sido usada por um impostor por mais de 10 anos.
Os registros apontam agens por cinco times de quatro estados: Sociedade Esportiva Ypiranga (PE), Associação Atlética Coruripe (AL), Sociedade Esportiva de Picos (PI), Retrô Futebol Clube Brasil (PE) e Lagarto Futebol Clube (SE).
Mas Iranaldo afirma que nunca teve vínculo com esses times.
O ex-jogador conta que atuou profissionalmente até 2010, tendo como último clube o Centro Limoeirense, de Pernambuco. Desde 2017, trabalha como servidor público em Mataraca, no litoral norte paraibano.
Ele afirma nunca ter deixado a cidade desde que assumiu o cargo. E, por essa razão, acredita que alguém usou seu nome para os contratos e jogou em seu lugar.
Em 3 de abril de 2024, o ex-jogador registrou um boletim de ocorrência e reuniu documentos.
Um levantamento feito no CNIS (cadastro nacional de informações sociais) do ex-jogador mostra que o nome de Iranaldo foi usado para firmar contratos com cinco clubes. As datas registradas, cruzadas com o período em que ele já estava fora do futebol ou atuando como servidor público, reforçam a evidência de fraude, segundo o advogado Carlos Dantas Filho, que o representa.
O caso é conduzido pela 4ª Vara Regional das Garantias da Comarca de Mamanguape. Segundo Dantas Filho, a Promotoria pediu a abertura de inquérito pela Polícia Civil da Paraíba. Procurados pelo UOL, nem a Polícia Civil e nem o Ministério Público da Paraíba responderam.
'Roubaram minha carreira'
Iranaldo diz que ficou abalado com a descoberta e teme que a situação comprometa sua integridade como ex-atleta. "Eu poderia até ser banido do futebol, de uma profissão que eu sempre sonhei."
A situação também agravou suas dificuldades financeiras, segundo relata, por ter sido impedido de sacar o abono do PIS/Pasep. "Perdi um direito meu como pai de família", lamenta.
A gente fica sem entender, é como se tivessem me roubado a vida. Roubaram minha carreira.
Iranaldo do Nascimento Silva
Até hoje, ele não sabe quem pode ter usado seu nome para atuar nos clubes. E afirma nunca ter visto a pessoa que se ou por ele e não reconheceria nem mesmo se visse imagens. "Nunca vi a cara dele, nem pessoalmente, nem por foto."
Você [o impostor] usou meu nome com muita má-fé. Suei para chegar onde cheguei. Você não suou nada. Eu jamais faria isso com você.
Iranaldo do Nascimento Silva
Para Iranaldo, com os recursos disponíveis atualmente, os contratos com os clubes deveriam ter ado por uma verificação mais rigorosa. "Não estou aqui para julgar os clubes, mas foi uma falta de atenção."
Advogado vê fraude robusta
Dantas Filho, que representa Iranaldo, classifica o caso como uma "fraude robusta". Ele afirma que os documentos apresentados deixam claro o uso indevido dos dados da vítima, inclusive em vínculos registrados no sistema do INSS.
"A fraude já está configurada. Agora o foco é identificar a autoria."
Para o advogado, a conduta envolve ao menos cinco crimes: estelionato, falsidade ideológica, falsificação de documento público, uso de documento falso e falsa identidade. "Iranaldo está tendo seus dados utilizados há mais de dez anos."
A expectativa da defesa é que os clubes prestem esclarecimentos durante o inquérito. "Qualquer colaborador da trama precisa ser responsabilizado", afirma Dantas Filho. Ele diz haver possibilidade de ação cível por danos morais e materiais.
O UOL procurou os cinco clubes envolvidos na denúncia. A atual diretoria da Sociedade Esportiva de Picos, no Piauí, informou não ter conhecimento do caso de Iranaldo. Os responsáveis pelo clube na data dos lançamentos também foram procurados, mas até o momento não retornaram. O espaço permanece aberto. Os demais clubes não retornaram.