Governo concede anistia a Dilma por tortura e indenização de R$ 100 mil
A Comissão de Anistia do Ministério dos Direitos Humanos decidiu hoje, por unanimidade, conceder anistia à ex-presidente Dilma Rousseff (PT) pela perseguição política e tortura que sofreu durante a ditadura militar.
O que aconteceu
Dilma receberá indenização de R$ 100 mil em prestação única, o máximo permitido. A comissão do governo Lula reconheceu que ela foi perseguida sistematicamente pelo Estado brasileiro durante o regime autoritário entre 1964 e 1985 e oficializou um pedido de desculpas em nome do governo federal.
Todos os conselheiros acompanharam o voto do relator, Rodrigo Lentz, que chamou o reconhecimento de "conquista democrática". Para ele, a concessão do pedido é política e simbólica, para garantir a memória e não-repetição dos atos da ditadura.
Requerimento de anistia foi protocolado há 23 anos, em 2002, ano em que a comissão foi criada. O processo foi suspenso a pedido da própria Dilma, enquanto ocupava os cargos de ministra do governo Lula e de presidente da República, mas voltou a tramitar em 2016, após o impeachment. Entre sessões suspensas e trocas de relatores, a Comissão de Anistia só analisou o caso pela primeira vez seis anos depois.
Dilma havia pedido reparação equivalente ao salário dela de funcionária da Fundação de Economia e Estatística do Rio Grande do Sul, cargo do qual foi afastada entre 1970 e 1990. Ela recebia R$ 10.735 mensais —multiplicados pelos 21 anos e 6 meses até a reintegração dela, o total seria de R$ 2,77 milhões, sem correção monetária. O teto legal das reparações, porém, é de R$ 100 mil em parcela única ou R$ 2 mil mensais.
Governo Bolsonaro negou em 2022
Em 2022, durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), a comissão rejeitou a solicitação de Dilma, também por unanimidade. Os membros entenderam que a solicitação da ex-presidente não podia ser analisada, já que ela já teve a anistia reconhecida pelo governo do Rio Grande do Sul. A petista então entrou com um recurso, que foi analisado hoje.
Bolsonaro comemorou a decisão na época. "Dilma Rousseff: perdeu. Quem sabe lá na frente, quando algum esquerdista voltar ao poder, espero que não aconteça, você receba uma pensão", disse durante uma live.
Dilma foi torturada
Dilma já era reconhecida como anistiada política em quatro estados. As comissões estaduais de anistia do Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo já haviam concedido a ela esse status. Em ao menos um desses casos, ela doou o valor da indenização para grupos dedicados ao combate à tortura.
Dilma ficou presa por três anos, entre o início de 1970 e o começo de 1972. Na época, ela era militante do grupo VAR-Palmares (Vanguarda Armada Revolucionária Palmares), grupo armado de combate à ditadura militar, e foi submetida a torturas por agentes do Dops em vários estados.
Em depoimento lido pelo relator na sessão de hoje, Dilma contou ter sido agredida, afogada, colocada em pau-de-arara, tomado choques, e levada ao Hospital Central do Exército duas vezes para tratar hemorragias graves, inclusive no útero. Além da tortura física, a ex-presidente também sofreu tortura psicológica, além de ter sido expulsa da universidade e demitida do emprego dela na Fundação de Economia e Estatística do Rio Grande do Sul.
Ali em Juiz de Fora [no Dops], eu descobri que alguns minutos poderiam durar séculos, e diferença entre sanidade e loucura estava em não se permitir ter muita consciência disso.
Dilma Rousseff, em depoimento citado hoje na Comissão de Anistia
Quis a história que a requerente tivesse seu requerimento relatado justamente por um filho da classe trabalhadora, que foi o primeiro a entrar na universidade [...], e hoje está aqui para poder proferir esse voto. E a história quis assim não por acaso. A história quis assim porque teve pessoas, e sobretudo mulheres, que ousaram não apenas contemplar a história, mas também a transformar a história e a fazer história. Esse é o legado das revolucionárias. E isso mostra que não só a vida, mas como a luta valeu, vale e valerá a pena.
Rodrigo Lentz, conselheiro da Comissão de Anistia e relator do processo de Dilma
A ex-presidente, que hoje comanda o Banco dos Brics, na China, não pôde comparecer à sessão. O UOL entrou em contato com a equipe de Dilma. Caso haja resposta, o texto será atualizado.